Litígio de limites entre Ceará e Piauí

Limites entre Ceará e Piauí
Litígio de limites entre Ceará e Piauí
Áreas litigiosas entre os estados do Ceará e Piauí.
Delimita:  Ceará
 Piauí
Comprimento: não informado
Características: litigiosos

O litígio de limites entre Ceará e Piauí compreende um território de aproximadamente 3 000 km², localizado na Serra da Ibiapaba, nos limites entre os estados brasileiros do Ceará e do Piauí.[1] As regiões reivindicadas passaram a ser popularmente conhecidas como Cerapió, Piocerá e Faixa de Gaza do Nordeste.[2]

História[editar | editar código-fonte]

Mapa do Piauí em 1761, mostrando o litoral piauiense para além do rio Timonha.
Mapa do Ceará em 1861, sem os municípios de Crateús e Independência.

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

O litígio tem origem no governo colonial de Manuel Inácio de Sampaio e Pina Freire, do Ceará (1812 - 1820), quando o engenheiro Silva Paulet apresentou um mapa da província que mostrava o limite oeste do litoral até a foz do rio Igaraçu. Dessa forma, a localidade litorânea piauiense de Amarração (atual cidade de Luís Correia) faria parte do território do Ceará. Posteriormente, o povoado de pescadores piauienses foi ocupado pela expedição do cearense Andrade Pessoa, com a alegação de proteger os moradores de uma possível batalha com as tropas do Major João José da Cunha Fidié que estava na região combatendo as revoltas, por ocasião das lutas pela independência do Brasil que culminou na Batalha do Jenipapo. Porém, a expedição de Andrade Pessoa não retornou para o Ceará, com essa ocupação resultando em muitos protestos por parte dos políticos do Piauí, com apoio até mesmo de políticos de Sergipe, que alegavam que as terras ocupadas pela expedição cearense eram piauienses, já no ano de 1832. No ano de 1835, a Assembleia Legislativa do Piauí alertou o Governo Imperial sobre a invasão. Entretanto, os protestos piauienses não foram atendidos. E, com o seu desenvolvimento o povoado foi apadrinhado pelo Estado do Ceará, que o converteu em uma freguesia em 1865, lhe dando o nome de Nossa Senhora da Amarração.[3]

Durante o século XIX a localidade teve assistência da cidade cearense vizinha, Granja, até que em 1874 os parlamentares estaduais decidiram elevar a localidade à categoria de vila. Tal atitude chamou a atenção dos políticos do Piauí que reivindicaram o território. A solução para o impasse ocorreu com o Decreto Geral nº 3.012, de 22 de outubro de 1880, determinando que haveria uma troca, na qual o Piauí restabeleceria a posse da freguesia da Amarração — com os limites estabelecidos pela Lei provincial do Ceará nº 1.360, de 5 de novembro de 1870 — e o Ceará incorporaria a região que abrangia as vilas piauienses de Príncipe Imperial (atual Crateús) e de Independência. E, que a linha divisória entre os dois estados seria a Serra da Ibiapaba, com o Piauí ficando com todas as vertentes ocidentais da referida serra e o Ceará, com as vertentes orientais.[4][5]

Desde essa época, portanto, que nos limites entre o Ceará e o Piauí persistem vários pontos com indefinições[6] e atualmente são encontradas áreas do lado esquerdo da Serra da Ibiapaba incorporadas ao território cearense, como, por exemplo, o atual município de Cocal e a povoação de Algodões.[3] Com ambas as unidades da federação continuam disputando o controle de tais locais.[7]

Proposta de resolução pendente[editar | editar código-fonte]

Em 1920, uma comissão especial foi formada para um convênio arbitral, que tinha como objetivo resolver o litígio fronteiriço entre os dois estados. Para a mesma, ficou como encarregado o Presidente do Estado de São Paulo, Washington Luís Pereira de Sousa. O mesmo deveria, juntamente com engenheiros, apresentar uma planta topográfica com um traçado representando os limites entre os estados até o final daquele ano. Para isso, os delegados do Piauí e do Ceará precisaram aceitar uma proposta, sendo escolhida a do Geógrafo cearense Tomás Pompeu de Sousa Brasil, presente no seu livro "O Ceará no começo do Seculo XX", de 1909, definindo os seguintes termos: "A oeste pelo Piauhy por uma linha que, partindo da Barra do Timonha, situada a 2° 54' 46 de latitude meridional e 2° 8' 7 de longitude oriental do Rio de Janeiro, segue pelo Rio São João da Praia acima até a barra do Riacho, que vai para Santa Rosa e dahi em rumo direto á Serra de Santa Rita até o pico da Serra Cocal, termo do Piauhy, continuando pela Serra Grande ou de Ibiapaba até a dos Cariris Novos, onde o solo deprime-se para, com o nome de Serra do Araripe". Porém, a proposta não foi apresentada e ocaso não foi resolvido.[3]

Após a Constituição de 1988, foi proposto que em 1991 seria resolvida a questão do litígio de limites entre os estados, mas só em 2003 que uma nova tentativa ocorreu, onde o Piauí propôs que as três áreas de litígio fossem divididas entre os estados, sendo que as duas menores ficaria com o Piauí e a maior com o Ceará. Porém o governo cearense não aceitou a proposta. Então o inverso também foi sugerido, mas novamente o Ceará não aceitou.[3] Posteriormente, em 2008 foi apresentado um acordo sobre a questão, com o Piauí ficando com 1 500 km² e o Ceará com 1 000 km².[8] No entanto, a proposta não obteve resultado.

O critério adotado pelo estado do Piauí para definição dos limites territoriais são as demarcações geográficas oriundas da proposta aceita pelos dois estados do convênio arbitral de 1920, baseada no decreto régio e no livro do geógrafo cearense. Enquanto que o Ceará defende o critério de ocupação das posses atuais para definir seu território, como também através de um plebiscito.[3]

Área de litígio territorial entre Ceará e Piauí de acordo com estudos do Exército Brasileiro

Em mais um episódio da questão fronteiriça entre o Piauí e o Ceará, o governo do Piauí ingressou com uma ação cível em agosto de 2011 junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) requerendo posse de um território de 2 821 quilômetros quadrados que atualmente está sob a administração do Estado do Ceará.[3][7] Porém o recurso direcionou a um trabalho de campo com técnicos do Piauí e do Ceará para subsidiar o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com informações suficientes para que o litígio fosse resolvido. Contudo, a questão ficou mais uma vez travada, já que essa comissão não chegou a uma solução.[3] Em janeiro de 2018, o ministro Dias Toffoli, então relator da ação, determinou realização de perícia pelo Exército Brasileiro, pendendo apreciação do laudo pela relatoria.[9] Com a análise do Exército sendo inicialmente prevista para terminar até novembro de 2020.[10]

Se o STF acatar o pedido do governo piauiense, o estado do Ceará perderá 66% do município de Poranga, 32% de Croatá, 21% de Guaraciaba do Norte, 18% de Carnaubal, 8% de Crateús, além de 7% de Ipaporanga.[7]

Em 2022, foi divulgado um estudo realizado pelo Exército Brasileiro, onde comprova que a divisa entre os dois estados é mais a oeste, ou seja, o Ceará deveria devolver ao estado vizinho um território ainda maior que o solicitado na ação. Se a ação do STF for aceita conforme o estudo do Exército, o Ceará perderia território de catorze cidades, incluindo sete sedes administrativas, além de 245 mil habitantes.[11]

A ação está sob relatoria da ministra Cármen Lúcia, mas ainda não há um prazo definido para ocorrer o julgamento. Os ministros podem decidir ou não por uma nova divisão de terras e, não está claro se o Supremo vai considerar uma nova divisa conforme o solicitado pelo Piauí ou se baseado no estudo do Exército Brasileiro.[11]

Populações envolvidas[editar | editar código-fonte]

A população da área em litígio estaria sendo atendida pelos serviços oferecidos pelo governo do Ceará, como postos de saúde e escolas.[7] Segundo o procurador-geral ajunto do Piauí, João Batista de Freitas Júnior, o governo cearense age de maneira irregular ao promover benfeitorias no território, uma vez que este não faz parte de nenhum dos estados.[7]

Devido ao impasse, boa parte das comunidades locais são desassistidas de serviços como assistência médica e segurança pública.[7] Segundo matéria publicada pelo jornal Diário do Nordeste, os moradores de Cocal dos Alves se deslocam até Viçosa do Ceará a fim de obterem assistência médica num posto de saúde localizado no lado cearense da divisa.[7] Segundo Sérgio Fontenele, secretário de Infraestrutura de Viçosa do Ceará, a determinação do prefeito Pedro da Silva Brito é de atender a todos, independentemente de Estado, mas o ônus fica com a gente e o bônus com o Piauí.[7]

Segundo ele, são cerca de cem as famílias que se encontram nessa situação.[7]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. Folha de S.Paulo Estudo do IBGE acirra disputa entre Ceará e Piauí por território. publicada em 15 de junho de 2013.
  2. CidadeVerde.com Há 350 anos, PI e CE disputam terras em área de litígio. publicada em 9 de fevereiro de 2009.
  3. a b c d e f g «Evolução das questões fronteiriças no leste do Piauí» (PDF). iracildefelima.webnode.com. Consultado em 28 de agosto de 2020 
  4. «DECRETO Nº 3.012, DE 22 DE OUTUBRO DE 1880». planalto.gov.br. Consultado em 28 de agosto de 2020 
  5. «História de Luís Correia, Piauí». IBGE. Consultado em 24 de janeiro de 2009. Arquivado do original em 16 de maio de 2011 
  6. «As fronteiras da dúvida». Época. 2002. Consultado em 24 de janeiro de 2009. Arquivado do original em 24 de julho de 2008 
  7. a b c d e f g h i Thomaz, Paula (23 de outubro de 2011). «A Faixa de Gaza do Nordeste». CartaCapital. Consultado em 24 de outubro de 2011 [ligação inativa]
  8. «Zona de Litígio entre Ceará e Piauí». Colégio Militar de Porto Alegre. 27 de fevereiro de 2008. Consultado em 24 de janeiro de 2009 
  9. «Andamento Processual ACO 1831». Supremo Tribunal Federal. Consultado em 3 de junho de 2020 
  10. «IBGE cumpre decisão judicial e Piauí incorpora terra de litígio com Tocantins». cidadeverde.com. Consultado em 28 de agosto de 2020 
  11. a b «Disputa territorial entre Ceará e Piauí: entenda o que pode mudar e o que os estados defendem». g1.globo.com. Consultado em 12 de junho de 2022