Guerra de Iguape

Guerra de Iguape

Mapa demonstrando as movimentações espanholas e portuguesas durante a Guerra de Iguape
Data c.1534 - 1536
Local Capitania de São Vicente
Desfecho
Beligerantes
  • Moradores espanhóis de Iguape
  • Aliados indígenas
Comandantes
Forças
A princípio
  • 80 soldados portugueses
  • Número desconhecido de soldados indígenas
  • Um navio (capturado)

Após o primeiro confronto

  • Forças desconhecidas
  • Até 40 colonos espanhóis
  • 150 arqueiros indígenas
  • Dois navios, quatro canhões
Baixas
Desconhecidas Desconhecidas

A Guerra de Iguape foi um conflito travado entre os colonizadores portugueses recém-chegados à Capitania de São Vicente e um grupo de espanhóis, portugueses e indígenas liderados por Ruy Garcia de Mosquera.

Assim que Martim Afonso de Sousa partiu da sua capitania, um número de espanhóis advindos do Rio da Prata liderados por Mosquera rumou norte em direção a capitania de São Vicente e se assentou nas proximidades de Iguape junto do bacharel. Quando o algum momento esses espanhóis foram convocados a se apresentar a vila de São Vicente. o bacharel atendeu ao pedido, mas Moschera não, dando início ao conflito.[4][5][6]

Não é possível, devido a falta de documentos, precisar uma data para o início da guerra,[6] mas sabe-se que ela iniciou com uma derrota portuguesa acachapante, resultando na invasão e saque da vila de São Vicente. No entanto, com o decorrer do conflito, os portugueses conseguiram arregimentar um número maior de soldados indígenas e expulsaram os espanhóis do litoral das capitanias de São Vicente e Sant'Ana por volta do ano de 1537.[4][7]

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

Expedição de Francisco de Chaves e Fundação de São Vicente[editar | editar código-fonte]

No dia 12 de agosto de 1531, depois de combater contrabandistas franceses ao norte da América portuguesa, Martim Afonso de Sousa atracou a sua esquadra perto do arquipélago de Cananeia e enviou Pedro Annes, piloto da expedição, para dentro do lagamar de Marataiama, e, cinco dias depois, o degredado português Bacharel de Cananeia, Francisco de Chaves e alguns castelhanos voltam a bordo. Eles, então, conversam com o capitão-mor e Chaves promete que, se lhe forem fornecidos os homens, ele voltaria dez meses depois com quatrocentos escravizados carregados de prata e ouro.[8][9]

No dia 1 de setembro, Pero Lobo Pinheiro, um dos capitães da esquadra, parte com Francisco de Chaves e mais oitenta homens para o interior do continente, em uma expedição que nunca mais voltaria. Tendo sido, provavelmente, dizimada no caminho.[10][11]

Martim Afonso de Sousa seguiu viagem em direção ao Rio da Prata, onde sofreu um naufrágio e percebeu que já estava muito além do Meridiano de Tordesilhas, o que o convenceu a retornar para a costa da sua capitania, onde fundou, no início de 1532, a vila de São Vicente.

Chegada de Ruy Garcia de Mosquera[editar | editar código-fonte]

Ruy Garcia de Moschera, segundo Ruy Díaz de Gúzman, era um dos colonos deixados por Sebastião Caboto no forte do Espírito Santo, na margem do rio Paraná próximo a sua foz. Certo dia, enquanto Moschera e mais quarenta soldados saíram para conseguir mantimentos em um bergantim, o forte foi atacado por indígenas e destruído, obrigando o espanhol e seus soldados a deixa o local, no que acabaram chegando na capitania de São Vicente, se estabelecendo em Iguape. Os espanhóis passaram, algum tempo depois (cerca de dois anos, segundo Gúzman) a viver com Duarte Peres, e foram intimados, nessa mesma época, por Pero de Góis, capitão-mor de São Vicente, a se apresentarem a vila e jurarem lealdade a Portugal, ao seu rei, e a Martim Afonso de Sousa, donatário daquelas terras. Peres aceitou a intimação, mas Mosquera recusou, alegando que estava em possessões castelhanas, dando início ao conflito.[1]

Guerra[editar | editar código-fonte]

Sequestro do navio francês[editar | editar código-fonte]

Outeiro do Bacharel visto da barra do Icapara.

Ficaram sabendo que Pero de Góis preparava uma expedição para forçar os espanhóis a se renderem. Duarte Peres em 1536, antes da iminência do ataque dos portugueses, com Mosquera, apoiados por duzentos índios armados com arcos e flechas, capturaram um navio corsário francês que pouco antes chegou a Cananéia em busca de mantimentos, apreendendo suas armas e munições.[12] Ruy Díaz de Guzmán descreveu a captura do navio:

A partir dessas demandas e respostas houve uma grande insatisfação entre um e outro; E nesta altura um navio de corsários franceses chegou àquela costa, que chegou à Cananeia, entrou naquele porto, e os espanhóis avisados, resolveram atacar o navio, e viram desembarcar dois marinheiros, que tinham saltado para abastecer-se com os índios, numa noite muito escura cercaram o navio com muitas canoas e jangadas, nas quais iam mais de duzentos arqueiros, e levando consigo os dois marinheiros franceses, ordenaram-lhes que dissessem que vinham com refresco e comida, que tinham saído para olhar, e não havia necessidade de suspeitar, porque tudo estava muito quieto; Em seguida, aqueles que estavam no navio se protegeram e lançaram as cordas para eles, enquanto as canoas tinham tempo de chegar, e pegar as escadas para subir; e os castelhanos e índios saltando para dentro, de repente lutaram com os franceses, os renderam e levaram o navio com muitas armas e munições, e outras coisas que eles trouxeram, com cujo sucesso os espanhóis estavam muito bem equipados para qualquer evento.(...)[1]

Primeiro embate[editar | editar código-fonte]

Imediatamente mandaram cavar uma trincheira em frente ao povoado de Iguape, no pé do morro conhecido como Outeiro do Bacharel onde construíram o Entrincheiramento de Iguape, guarnecendo-a com quatro das peças de artilharia do navio francês. Em seguida, providenciaram para que vinte espanhóis e 150 indígenas fizessem uma emboscada no manguezal, na foz da barra de Icapara, à espera da força portuguesa. que foi recebida com fogo de artilharia.

Os portugueses que sobreviveram foram obrigados a recuar e, durante a retirada, foram surpreendidos pelos espanhóis emboscados na boca da barra, onde a maioria foi morta, sendo Pero de Góis gravemente ferido no olho por um tiro de arcabuz.[13]

Saque de São Vicente e retirada[editar | editar código-fonte]

No dia seguinte, os espanhóis embarcaram no navio francês, precedido do navio de Pero de Góis, e atacaram de surpresa a vila de São Vicente, que ocuparam e saquearam, matando dois terços dos seus habitantes e deixando para trás quase tudo destruído. Após isso se retiraram da capitania e rumaram para o sul, no que foram perseguidos pelos portugueses liderados por Pero de Góis e Gonçalo Monteiro até, pelo menos, a Ilha de Santa Catarina, onde passaram alguns dias e se encontraram com Gonzalo de Mendoza, que vinha de ordens de seu irmão, Pedro de Mendoza, a procura de suprimentos para a recém-nascida colônia de Buenos Aires. Gonzalo encontrou Mosquera e os demais espanhóis, assim como alguns portugueses, e os trouxe de volta ao Rio da Prata.[6][14]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Notas

  1. Não há consenso sobre quem tenha sido esse homem, que é referenciado, em algumas fontes, como em La Argentina de Ruy Díaz de Guzmán, com o título "bacharel".[1] Alguns autores, como Jaime Cortesão, afirmam que seja a mesma pessoa que encontrou Diego García e Martim Afonso de Souza nas suas expedições em 1527 e 1531[2], respectivamente. Entretanto, outros autores, como o historiador Ernesto Young, afirmam que esse seja outra pessoa, por isso, nesse artigo, eles serão tratados como duas pessoas distintas.[3]

Referências

  1. a b c «La Argentina. Historia del Descubrimiento y Conquista del Río de la Plata. Silvia Tiffemberg (edición crítica, prólogo y notas con la colaboración de Javier Jaque Hidalgo). Facultad de Filosofía y Letras. Universidad de Buenos Aires, 2012.ISBN 978-987-1785-55-1» (PDF). Cópia arquivada (PDF) em 28 de agosto de 2017 
  2. Cortesão, Jaime (1990). Os descobrimentos portugueses, Volume 3. [S.l.]: Imprensa Nacional-Casa da Moeda. pp. 717–723. ISBN 9722704222 
  3. Young, Ernesto Guilherme (2 de outubro de 2023). «Subsídios para a história de Iguape: Seus fundadores». Typographia do "Diário Oficial". Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (v. 7): 286 - 297 
  4. a b Varhagen, Francisco Adolfo de (1877). História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Em casa de E. e H. Laemmert. pp. 165 – 166 
  5. Almeida, Antônio Paulino de (20 de setembro de 1961). «Memória histórica de Cananéia (III)». Revista de História (48): 393–445. ISSN 2316-9141. doi:10.11606/issn.2316-9141.rh.1961.121543. Consultado em 1 de outubro de 2023 
  6. a b c J. J. Machado d'. Oliveira (1864). Quadro historico da provincia de São Paulo (em Portuguese). unknown library. [S.l.]: Typographia Imparcial de J.R.A. Marques 
  7. Young, Ernesto Guilherme. «Esboço histórico da fundação da cidade de Iguape». Typographia Aurora. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (v. 2): 49 - 151 
  8. Sousa, Pero Lopes (1927). Diario da navegação de Pero Lopes de Sousa, 1530-1532 : Documentos e mapas : Vol. II. Rio de Janeiro: Typographia Leuzinger. pp. 203 – 206 
  9. Young, Ernesto Guilherme. «Esboço histórico da fundação da cidade de Iguape». Typographia Aurora. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (v. 2): 49 - 151 
  10. Cervantes, Biblioteca Virtual Miguel de. «Historia general y natural de las Indias, islas y tierra-firme del mar océano. Tomo primero de la segunda parte, segundo de la obra». Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes (em espanhol). p. 188. Consultado em 30 de setembro de 2023 
  11. Varhagen, Francisco Adolfo de (1877). História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Em casa de E. e H. Laemmert. pp. 165 – 166 
  12. Anales de la República Oriental del Uruguay: notas para escribir la historia civil y colonial, Volumen 1, pág. 20. Autor: Mariano Balbino Berro. Publicado en 1895
  13. «HISTÓRIA DO MUNICÍPIO DE IGUAPE» 
  14. Estudio histórico sobre el descubrimiento y conquista de la Patagonia y de la Tierra del Fuego. Pág. 269. Autor: Carlos Morla Vicuña. Editor: F.A. Brockhaus, 1903

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Donato, Hernâni. Dicionário das batalhas brasileiras. São Paulo: Ibrasa, 1987.
  • Luz Soriano, Simão José da. Historia da Guerra Civil e do estabelecimento do governo parlamentar em Portugal, comprehedendo a historia diplomatica, militar e politica d'este reino desde 1777 até 1834. Lisboa, Impr. Nacional, vol IV, 1870 p. 497.
  • YOUNG, Ernesto G. Esboço Histórico da Fundação da cidade de Iguape. Revista do IHGSP, vol II, São Paulo, 1896 pp. 49–151.