Arte do Paleolítico

A arte do Paleolítico refere-se ao início da história da arte e à mais antiga produção artística de que se tem conhecimento. A arte deste período situa-se na Pré-História, no Paleolítico ou Idade da Pedra Lascada, e tem início há cerca de dois milhões de anos estendendo-se até c. 8000 a.C..

O Paleolítico é um dos três períodos da Idade da Pedra, ao qual se segue o Mesolítico e, posteriormente, o Neolítico ou Idade da Pedra Polida, e que se situa, do ponto de vista geológico, na Idade do gelo, mais precisamente no Pleistoceno.

Somente no início do século XX são feitas as primeiras descobertas de achados pré-históricos e a primeira reação da classe especialista é a de cepticismo relativamente à aparente maturidade artística num nível tão embrionário da história da humanidade. Considerava-se até então que a primeira semente artística teria sido lançada no Antigo Egipto e na Mesopotâmia. Embora ainda hoje persistam dúvidas quanto ao efetivo objetivo das peças de arte paleolíticas, a verdade é que a qualidade e criatividade que revelam são inegáveis e de extrema importância para a compreensão da mentalidade do homem.

Neste período foram fabricados instrumentos de pedra talhada, decoração de objectos, joias para diferentes partes do corpo, pequenas estatuárias representando a figura feminina ou animais, relevos e pinturas parietais com temática de caça e figuras isoladas de animais ou caçadores.

História[editar | editar código-fonte]

Ver artigo principal: Paleolítico
Machados, Acheulense, Saint Acheul.

O período Paleolítico possui três subdivisões, sendo essas:

Considera-se que é no último período (Paleolítico Superior) que o homem dá o mais significativo passo na produção artística consciente, como resultado de uma necessidade espiritual. No entanto é possível que este nível seja o culminar de um longo processo de amadurecimento artístico e técnico, e que muito do que foi criado em épocas anteriores simplesmente não tenha sobrevivido até aos nossos dias. Por esta razão subsistem ainda muitas incógnitas e questões em aberto, podendo-se apenas especular sobre quais seriam as verdadeiras motivações artísticas do Homem pré-histórico.

Para uma abordagem mais próxima às primeiras criações artísticas é essencial relacioná-las com o seu plano de fundo cultural, geográfico e social. Indissociável do seu meio-ambiente, o qual nem sempre é propício à vida humana, o Homem é por ele extremamente influenciado, levando a que as suas decisões (deslocamentos a outros locais, etc) sejam ditadas por condicionantes e factores naturais. Que os temas da arte paleolítica foquem, acima de tudo, elementos do seu meio-ambiente (como o reino animal, principalmente o alvo da sua caça – manadas de renas das planícies e vales) surge assim como uma consequência lógica.

Influências culturais e especificidades regionais[editar | editar código-fonte]

Durante os dois primeiros períodos do Paleolítico (Inferior e Médio) a área da ocupação humana vai estar reduzida à África, Ásia e Europa. O achado arqueológico por excelência é o artefacto talhado em pedra (machados, etc), que se vai aperfeiçoando tecnicamente ao longo da Pré-História, e que transmite já uma certa preocupação estética pela procura da simetria.

Embora existam características específicas de cada região, observa-se, simultaneamente, uma certa unidade entre os achados, unidade esta que espelha a existência de contactos entre diferentes grupos de diferentes regiões (p. ex.: a utilização generalizada do vermelho).

A partir do Paleolítico Médio dá-se um “corte” na continuidade da influência cultural entre os continentes, em que a África (exceptuando o norte) e a Ásia seguem caminhos distintos do da Europa. Durante o Paleolítico Superior, quando o Homo sapiens sapiens surge no lugar do Homo neanderthalensis, segue-se o alargamento da área de ocupação humana na América e na Austrália, possibilitado pela redução do nível do mar na Era glacial e o consequente surgimento de “pontes” de gelo de ligação a esses continentes.

Os achados arqueológicos americanos denotam bem a sua proveniência da Ásia oriental, mas acabam também por evoluir para características próprias. No entanto, pouco se deixa reconstruir da produção artística deste continente durante o Paleolítico devido à reduzida informação arqueológica disponível. Quando a ligação natural à Austrália deixa de existir, a comunicação de outros povos estabelecida até então com este continente leva o mesmo caminho, e o isolamento que se segue resulta no “empobrecimento” da cultura aí presente.

É por estes diversos factores que a Europa e a Índia são as regiões que oferecem, até ao momento, os melhores testemunhos de estudo da cultura paleolítica, a partir dos quais melhor se pode compreender a interpretação que o Homem paleolítico faz do seu mundo. Na França e norte de Espanha podem-se observar dos mais ricos exemplares de pintura rupestre, com base nos quais se pode afirmar a existência de um importante florescer artístico nestas áreas. Mesmo assim torna-se difícil precisar se terá tomado aqui lugar a origem do processo da consciencialização humana e, consequentemente, se terá aqui iniciado a sua evolução artística. A própria área actual dos achados a nível mundial não pode ser entendida como definitiva, uma vez que a preservação das obras muito depende das boas condições dos locais onde foram criadas.

O momento de transição[editar | editar código-fonte]

Contorno de mão na caverna de Pech Merle, França.

Após o início da produção manual de objectos começam a surgir os primeiros indícios de decoração dos mesmos, mas só no Paleolítio Superior se fazem as primeiras tentativas de transpôr algo real para um determinado suporte. Para isto é necessário uma observação cuidada da natureza envolvente e a percepção de que é possível a reprodução do mundo visível através de um novo método.

Este método implica a captação da realidade e, no caso da pintura e do relevo, a passagem da tridimensionalidade para um plano bidimensional que resulta, inicialmente, em representações de grande naturalismo e realismo. O Homem faz também uso de rochas ou pedaços de osso ou madeira que se assemelhem a um determinado animal, tirando partido dessa associação e das características preexistentes do suporte para criar uma escultura ou relevo (por vezes também associando a pintura).

O Homem compreende que a arte lhe possibilita uma relação mais estreita com a natureza e que ele próprio pode usar a sua representação para exercer influência sobre o mundo que o rodeia. Através da imagem os factores essenciais à sua existência podem ser dominados e o Homem pode revelar as experiências dos seus sentidos. Mais tarde, quando começa a reflectir sobre si próprio e o mundo envolvente, passa progressivamente a representar imagens idealizadas, ao invés de simplesmente imagens observadas. A partir deste momento começa a aproximando-se cada vez mais da sintetização dos elementos e da sua esquematização simbólica (como o caso das estatuetas femininas onde se realçam as características da feminilidade em linhas simples).

Abordagens sobre o objectivo da arte[editar | editar código-fonte]

De um modo geral, a hipótese mais defendida sobre o objectivo da arte paleolítica é a que os primeiros objetos de arte não eram utilitários ou adornos, mas uma tentativa de controlar forças sobrenaturais e, segundo especulam os arqueólogos, obter a simpatia dos deuses e bons resultados na caça. Considerando que as pinturas descobertas em cavernas se encontram em locais de difícil acesso, e não à entrada ao olhar de todos, pode-se supor que o objectivo não é proporcionar uma imagem impressionante acessível a todo o grupo, a arte pela arte, mas antes seguir um ritual mágico. Assim, o resultado estético (de grande naturalismo) não será mais que uma consequência secundária do objectivo principal. De qualquer modo não se pode eliminar totalmente a hipótese de um objectivo estético consciente.

Talvez existisse uma ténue linha divisória entre a realidade e a representação e que, ao se pintar um animal, fosse necessário recriá-lo com o maior realismo possível, para que a caça bem sucedida na pintura se transportasse para a realidade, ou ainda, que a criação pictórica de uma manada resultasse na sua criação real, e que o Homem pudesse assim beneficiar de muito alimento e prosperidade. Do mesmo modo se crê que as pequenas estatuetas femininas sejam amuletos relacionados com o culto da fertilidade, factor crucial para a sobrevivência do grupo.

Porém é importante uma ressalva: precisamos pesar as ações do homem, no caso no campo da representação em imagens, como não estritamente vinculadas à representações religiosas ou a uma busca trancedental de "um algo maior". Assim como uma criança que brinca com lápis de cor e papel com formas e cores de forma lúdica, não podemos descartar a arte paleolítica como uma atividade lúdica, um descobrir formas sem maiores pretensões.

Estatuetas de vénus[editar | editar código-fonte]

Na escultura paleolítica, destacam-se as estatuetas femininas de pequenas dimensões designadas genericamente por vénus. Identificadas como possíveis ídolos para o culto da fertilidade e sexualidade estas figuras apresentam características semelhantes entre si; são representadas nuas, de pé e revelam os elementos mais representativos do corpo feminino em linhas exacerbadas. O exagero destes elementos traduz-se em seios, ventre e ancas volumosos em oposição a braços e pernas delicados e cabeça pequena. A face, tratada com linhas simples reduzidas ao essencial, onde não é possível reconhecer traços individuais, transforma-se, com o tempo, num elemento cada vez mais estilizado e simbólico, assim como todo o corpo da figura.

Estes ídolos surgem pela primeira vez durante o Paleolítico e são a origem dos ídolos da arte cicládica de 2000 a.C.. A mais antiga estatueta conhecida é a Vénus de Tan-Tan encontrada em Marrocos do período Acheulense e com 6 cm de altura. Entre as mais antigas, com 30.000 anos, contam-se as vénus encontradas na Europa, na área do Danúbio, como a Vénus de Willendorf da Áustria, a Dame de Sireuil da França, a Mulher com corno de Bisonte feita em relevo em rocha, na França, de formas realistas, ou a Vénus de Vĕstonice da República Checa de formas estilizadas.

Pintura paleolítica[editar | editar código-fonte]

Ver artigo principal: Pintura rupestre

No período do Paleolítico Superior são feitas as primeiras pinturas em cavernas e paredes externas de pedra, há aproximadamente 15 000 anos. A representação de vários animais (cavalos, mamutes, bois, veados) é comum, como se pode observar na caverna de Lascaux, França - sítio arqueológico descoberto em 1940.

Aproveitando-se das irregularidades naturais das pedras, o homem do paleolítico chega, com suas pinturas, próximo das formas reais da natureza. Utiliza para os seus trabalhos diversos materiais como carvão, terra e sangue, além de pincéis e osso oco como instrumento de sopro (ex.: para pulverizar o contorno da mão obtendo um negativo).

Outras importantes pinturas rupestres foram descobertas na caverna de Altamira, Espanha, por Marcelino Sanz de Sautuola. Em Altamira encontram-se pinturas nas paredes e no próprio teto da caverna, consideradas até hoje uma das maiores descobertas da história da arte.

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Ver também[editar | editar código-fonte]

Fontes[editar | editar código-fonte]

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • ALARCÃO, Jorge, História da Arte em Portugal – do Paleolítico à arte visigótica, Publicações Alfa, Lisboa, 1986
  • HINDLEY, Geoffrey, O Grande Livro da Arte - Tesouros artísticos dos Mundo, Verbo, Lisboa/São Paulo, 1982
  • JANSON, H. W., História da Arte, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1992, ISBN 972-31-0498-9
  • MÜLLER_KARPE, Grundzüge früher Menschheitsgeschichte I – Von den Anfängen bis zum 3. Jahrtausend v. Chr., Theiss, Stuttgart, 1998, ISBN 3-8062-1309-7
  • STRICKLAND, Carol. Arte comentada: da pré-história ao pós moderno. 7. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002.
  • THIELE, Carmela, Skulptur, Schnellkurs, DuMont Buchverlag, 1995, ISBN 3-7701-3537-7
  • TORBRÜGGE, Walter, Enzyklopädie der Weltkunst – Das Entstehen Europas, Holle Verlag, Baden-Baden, 1977, ISBN 397-355-18-02
  • WETZEL, Christoph, Das Reclam Buch der Kunst, Reclam, 2001, ISBN 3150104769

Referências